terça-feira, 6 de março de 2012

"A chave de casa" e "Dois rios" de Tatiana Salem Levy


Vez e outra, percebo que vejo as coisas na contramão dos outros. Com A chave de casa, primeiro livro da escritora Tatiana Salem Levy, me senti assim. Depois que o terminei, ao pesquisar um pouco sobre a autora e a obra, entendi que o livro era "sobre" a busca de uma identidade cultural. Com isso, me dei conta de que o que poderia ser considerado principal na obra foi o que vi de mais secundário.

Porque, para mim, o que sobressaia era a relação da protagonista com ela própria, com sua mãe e com o homem na sua vida. Meu olhar perdeu o macro e se fixou no micro. A chave que a protagonista recebe de seu avô e que, supostamente, a leva à Turquia em busca da reconciliação com o passado de sua família se tornou pano de fundo na minha leitura. Por outro lado, me parece que a riqueza do livro se encontra nos diálogos que a protagonista imagina com a mãe falecida, na sua tentativa de vencer a perspectiva negra que tem sobre as coisa, no desenrolar trágico de seu relacionamento.

O genial na obra é que cada elemento desse (além de outros) é explorado em uma linha narrativa própria, de modo que histórias são contadas paralelamente. Ao contrário do que se possa pensar, o leitor não se perde em meio a tantas vozes, e isso se dá graças à escrita de Tatiana. Sabemos onde estamos graças aos fatos narrados, mas também às escolhas linguísticas da autora.





Em Dois rios, a autora explora o "e se" a partir da história de dois irmãos gêmeos, Joana e Antônio, e o encontro deles com a francesa Marie-Ange. Depois de uma perda significativa na infância, os irmãos desenvolveram formas diametralmente opostas em lidar com a vida. Um se torna o inverso do outro. Marie-Ange é a oportunidade de libertação de um e reconciliação de outro. E a obra, que me lembrou On Chesil Beach de Ian McEwan nesse aspecto, mostra como o silêncio pode minar as relações.

A chave de casa me parece um livro mais vertical e lírico do que Dois rios. Gostei mais daquele do que deste, mas isso pode ser decorrente daquela questão do "primeiro livro": o primeiro livro que leio de um autor sempre me marca. No caso da Tatiana Salem Levy, coincidiu que o meu primeiro é o primeiro dela, rs. De resto, só me ocorre ainda falar de um aspecto em comum que me tocou: a inadequação da protagonista das duas obras em estar no mundo, seja pela incapacidade de ser feliz, seja pelo apego à redoma em que vive.

Parece familiar? ;o)


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